O trabalho e nossa identidade

Uma vez conversando com um amigo sugeri a ele que saíssemos de onde estávamos trabalhando para começar nosso próprio negócio. Ele me respondeu uma coisa que me marcou: “André, quando saímos de onde trabalhamos perdemos nosso sobrenome. Deixamos de ser reconhecidos por isso”. Recentemente eu entendi bem o que ele quis dizer com isso.

Primeiramente, precisamos reconhecer que ao iniciarmos um trabalho ele se funde em nossa identidade. Ao realizarmos esse trabalho por uma parte significativa do dia, assumimos comportamentos que estão muito ligados às atividades que desempenhamos. Essa mudança é tantas vezes tão profunda que faz com que mudemos nosso comportamento original, ou seja, a forma como éramos reconhecidos pelas pessoas. A forma como somos reconhecidos pelas pessoas é a nossa identidade.

Mas não é apenas isso! Como essa mudança ocorre dentro de nossa subjetividade, passamos a acreditar e reconhecer uma nova pessoa dentro de nós em função da realização deste trabalho. É como se a gente estivesse desenvolvendo uma nova personalidade em função do contexto de trabalho que temos. Passamos a falar diferente, usar a linguagem do trabalho em nossas vidas pessoas e, inclusive, acreditar em ideias que são plantadas no núcleo do trabalho. Muitas vezes nosso propósito de vida está ligado ao que a empresa faz, ou seja, nossa identidade fica totalmente dependente da identidade da empresa.

A influência do trabalho na nossa subjetividade, na construção da nossa identidade representa algo importante. Tal construção histórica em cada um de nós pode ser a explicação de quadros de depressão em função de aposentadoria e demissões. Quantos de nós não ouviram ou viram relatos de pessoas se questionando o que seria de sua vida depois de serem demitidos? Para essas pessoas, sua vida é seu trabalho, não é sua vida pessoal, suas famílias e amigos. Elas assumem tamanha relação identitária com o trabalho que perdem o chão quando seu sobrenome volta a ser o que está em sua certidão de nascimento.

Entretanto, isso não é o mais grave de tudo! Existem situações em que a pessoa, além de ter sua identidade mudada pelo trabalho, não gosta do trabalho que faz. Imagine você sendo mudado por algo que não gosta? Bom, isso é possivelmente mais comum do que a gente imagina e muitos de nós acabam assumindo a identidade de algo que não gostam. Fico pensando se depois disso elas não passam a desgostar de si mesmas?

Mas por que as pessoas fariam isso? Talvez a resposta esteja mais próxima de nós do que imaginamos e seja simplesmente porque queremos manter/comprar o que não precisamos em troca do que realmente importa. Talvez seja porque o trabalho representa uma ideia de utilidade e importância na sociedade, a tal aceitação social. Talvez seja por uma natureza autodestrutiva carregada por alguns de nós… Enfim…

Qual a pressa?

Hoje voltando da academia eu notei várias pessoas cruzando a Av. Paulista enquanto o sinal estava fechado para o pedestre. Eles atravessaram até o meio e ficaram na ciclofaixa esperando pela abertura do sinal. Fiquei observando a correria e como essas pessoas acabaram se colocando em risco correndo na frente de carros e se colocando em um local pouco protegido no meio da avenida. Por que elas fizeram isso? E não eram poucas pessoas…

Já notaram que essa pressa e correria do dia a dia é uma característica do momento atual em que vivemos. Fazemos tudo corrido, em todos os lugares. Tudo é urgente, tudo é prioritário, e a gente está tão inserido nesse contexto que não consegue notar essa loucura em que vivemos. Está tão arraigado em nosso comportamento que as pessoas que atravessaram no vermelho não devem ter notado que fizeram isso para ganhar 10 segundos.

Acabo notando essas coisas por conta da prática da Esgrima. Quando jogamos (especialmente quando somos mais inexperientes), temos uma pressa instintiva em tentar terminar o ponto rapidamente. Na sala de Esgrima nosso treinador está sempre falando: “calma, não se apresse, use a pista, trabalhe o ponto”. À medida que vamos treinando, ouvimos menos dessas instruções 😂, mas ainda assim é difícil controlar. A razão é óbvia, fora da sala de Esgrima estamos sempre pressionados a fazer as coisas com pressa.

O que fazer então? Estamos fadados a sempre correr, a nos apressar por causa do contexto? Não, não estamos. Ontem eu recebi uma mensagem de um cliente/parceiro por volta das 17h, respondi hoje às 11h depois de pensar muito em como melhor responder. Podemos escolher seguir aceitando essa pressa toda, ou podemos parar, respirar, trabalhar melhor o ponto para depois reagir. É uma escolha nossa… até mesmo para atravessar a rua!

Existem momentos para reagir rápido, ter pressa na vida, mas é provável que sejam a exceção! Se observarmos bem, podemos identificar esses momentos. Basta entrar com passo curto e lento: touché!

Caindo para cima

Estou lendo o livro do Shawn Achor, The Happiness Advantage. É um livro interessante com bastante embasamento científico que me chamou a atenção por alguns termos provocativos colocados pelo autor. Cair para cima é um desses termos. Basicamente, o que o autor quer dizer com isso é que, na adversidade, quando a vida nos dá uma porrada, ao invés de nos colocarmos para baixo, podemos usar a frustração da situação para ficar mais fortes e crescer. Algo semelhante a ideia do psicólogo Austríaco Alfred Adler.

Bom, esse livro se baseia na psicologia positivista, que busca olhar o mundo sob as lentes do lado construtivo das coisas ou dos eventos. Trocando em miúdos, seria como olhar o copo meio cheio. Mas o legal disso é que essa abordagem tem um lastro interessante na forma como o nosso cérebro funciona. De forma simples, vemos normalmente o que queremos ver. Se damos muito foco em coisas negativas, vamos ter a impressão de que tudo que passa com a gente é ruim. Por outro lado, se mudarmos o foco para coisas positivas, vai parecer que somos muito sortudos.

Outro termo que me chamou atenção foi “aleijado pela frustração”. Esse é forte E descreve pessoas que, em função de experiências negativas, não possuem forças para se erguer e buscar soluções ou saídas ficando emocionalmente, ou mentalmente, aleijadas e incapacitadas. Eu particularmente acho uma posição extremista, mas ao mesmo tempo, vejo com bastante frequência pessoas que se colocam nessas situações por diversas razões. Uma dessas razões é que muitas vezes deixamos que eventos externos controlem as nossas vidas ao renunciar a ações que podemos fazer por nós mesmos para nos protegermos destas situações.

Na realidade, coisas boas e ruins vão acontecer com a gente a todo momento, mas se vamos cair para baixo ou para cima, vai depender muito da maneira como vemos o mundo ao nosso redor. Tomar o controle e buscar ações que nos protejam e forcem visões positivas é outro aspecto que contribui para cairmos para cima. No final, muito é questão do controle de perspectiva, controle de contexto e controle de ações.

Pequenas vitórias…

Estamos sempre muito atentos as grandes conquistas das pessoas. Desde cedo a gente é cobrado por nossas grandes conquistas. Na escola somos verdadeiramente reconhecidos quando tiramos notas altas. No esporte quando chegamos ao podium. No trabalho, quando recebemos uma promoção importante ou um bônus em dinheiro. Nosso mundo gira em torno das grandes conquistas. É um comportamento tão arraigado que provoca guerras e é capaz de transformar a ação de várias pessoas.

Não acho errado querermos obter grandes conquistas, afinal de contas, o que seria da humanidade sem as grandes conquistas. A pergunta é, a nossa vida é feita apenas de grandes conquistas? Logicamente, não! Muitas pessoas inclusive passam a vida inteira sem obter nenhuma grande conquista. Isso sem levar em consideração que o termo “grande conquista” é muito relativo de cada pessoa.

Mas, e se a gente subverter a lógica que fomos ensinados e nos focarmos e valorizarmos as pequenas vitórias do dia a dia? Ao contrário da grande, a pequena vitória não é relativa, ela é granular e pequena. Por exemplo, chegar cedo todo o dia na escola e prestar atenção na aula são duas pequenas vitórias diárias. Se hidratar e dormir 8 horas por dia, mais duas. Caminhar e ler 20 páginas de um livro, mais duas. Enfim, poderíamos nos orgulhar de cada uma das dezenas de pequenas vitórias que conseguimos a cada dia, mas não o fazemos porque estamos sempre preocupados com as grandes conquistas.

Ah, e tem um detalhe muito importante sobre as pequenas vitórias: elas não são para os outros verem, são para nós mesmos!

É provável que se a gente se concentrasse em fazer bem cada pequena atividade, obtendo cada pequena vitória associada a ela, no acumulado chegaremos naturalmente às grandes conquistas. Trabalhar nas pequenas atividades e vitórias evita que divaguemos no futuro por coisas fora do nosso controle. Não só isso, a consciência da obtenção das pequenas vitórias nos dá rápidas recompensas emocionais necessárias para a manutenção consistente das pequenas atividades. A consequência direta disso é uma maior percepção de felicidade e completude.

Já pensou parou para pensar nisso?

Novo começo…

Ontem uma amiga me mandou a seguinte frase: “Não tenha medo de começar tudo de novo. Talvez você goste mais da sua nova história”. Acho esse tipo de frase sensacional porque reflete em grande parte a minha vida. Sempre fui cercado, ou envolvido, por grandes mudanças. Desde que me entendo por gente a vida foi me empurrando por caminhos que impuseram mudanças em diversas áreas. A construção da minha personalidade acabou sendo amplamente influenciada por isso.

Falando de um passado mais recente, desde que vim para São Paulo as coisas não saíram exatamente como planejei. Todo o trabalho que pegava começava por algo e logo era puxado em outra direção. Não à toa, embora com formação técnica, acabei por pousar na área de vendas. No estudo, comecei em Engenharia e depois de mais de 25 anos aterrissei na Psicologia. No esporte, comecei correndo e hoje faço Esgrima e mais uns exercícios malucos que o Daniel inventa.

Quando vemos uma frase como essa que minha amiga me mandou tendemos imaginar que a mudança é intencional. Isso é um erro, quase nunca mudamos de maneira intencional. Ao contrário, sempre buscamos evitar a mudança. No meu caso, o que descrevi acima não foi intencional. Cada mudança foi acontecendo porque foram me puxando. As pessoas, o contexto, foi me abrindo as oportunidades de mudança e eu fui entrando. O mais importante disso é que eu nunca bloqueei a mudança. Nunca deixei de me permitir experimentar algo novo.

Então em relação a frase, não é que precisemos buscar a mudança. Na grande maioria das vezes precisamos estar ABERTOS às mudanças. As oportunidades sempre vão aparecer em nossas vidas, cabe a nós estar abertos a recebê-las. É, mais uma vez, uma escolha que fazemos.

Claro que ficar mudando assim não é para todo mundo. A personalidade de cada um é quem vai ditar o ritmo e frequência de mudança. Para mim, particularmente, a mudança significa uma oportunidade de experimentar algo novo. Tenho claro que a passagem nesse mundo é curta e o que vai valer no final de tudo é a experiencia vivida por cada mudança experimentada. Não me abro para mudanças, mas sim, por novas experiências.

A jornada é sempre mais interessante que o fim!

Na defensiva

Você já sentou para conversar com uma pessoa e sentiu que ela estava na defensiva com o seu argumento? Quantos de nós estamos realmente abertos a novas experiências ou conhecimento? Faz parte de nosso traço de personalidade o quão aberto estamos a aprender ou ter novas experiências. As pessoas se comportam de formas diferentes em relação a isso.

Um dos fatores que define esse traço é o contexto que vivemos e que estamos inseridos. Quanto mais justo, aberto e seguro esse contexto, maior nossa abertura a novos conhecimentos e experiências. Por exemplo, viver em ambientes muito competitivos e cidades grandes onde há uma certa briga para sobreviver, desfavorece esse traço.

Mas uma das coisas que me surpreende em relação a esse traço é de que algumas pessoas se abrem para aprender com conteúdo de mídias sociais mas se fecham para aprender com pessoas reais, como pais, familiares e amigos. Muitos jovens, por exemplo, tendem a buscar e defender mais conteúdo de TikTokers que o conhecimento de outras pessoas de referência. Aqui em casa temos problemas para demonstrar que o conhecimento das mídias sociais não é adequado.

Ontem conversando com uma pessoa do trabalho falávamos também de quanto os clientes estão na defensiva em relação a aprender novos conhecimentos de fornecedores de tecnologia. Faz parte do traço de abertura discutido antes e o ambiente competitivo das empresas não favorece. Não tenho certeza, entretanto, de como eles procuram aprender e ou experimentar novidades. De repente usam o YouTube ou influencers no LinkedIn como fonte de conhecimento também. O fato é, para aprender de fornecedores, eles se fecham.

Tenho algumas suspeitas de como transpor essas barreiras defensivas nas pessoas. Os TikTokers dão a dica: formato do conteúdo. Eles sabem formatar para informar sobre algo. A segunda é o valor percebido da informação: se o destinatário entende o valor, ele se abre. Mas a terceira é mais interessante: ninguém quer ter que engolir conteúdo forçado. Bom, é testar para ver se funciona 😬

Desejo de reconhecimento

Vocês já notaram ou sentiram que temos um desejo natural de sermos reconhecidos, de sermos importantes ou de que as pessoas gostem da gente? Já tiveram aquela sensação ou se perguntaram: “será que fulano gosta de mim?” Ou: “eles nunca me convidam para fazer tal coisa, será que gostam de mim?”

Esse é um sentimento, ou melhor, um comportamento natural que carregamos em nosso corpo segundo a Psicologia Evolucionista. Desenvolvemos esse comportamento em função de um pseudo altruísmo, muitas vezes procuramos ser agradáveis esperando receber algo em troca ou até mesmo nos posicionarmos melhor na hierarquia social. Esse receber algo em troca é o desejo de reconhecimento.

Nos dias de hoje aprimoramos esse comportamento e nos utilizamos das mídias sociais para construir vidas fictícias e perfeitas com o intuito de gerar nos outros o sentimento de reconhecimento em relação a gente. Queremos que os outros vejam que somos bons e que merecemos o reconhecimento deles através de um mundo perfeito em que vivemos nas mídias sociais.

Mas isso não é novo, como disse anteriormente, é um comportamento antigo que era colocado em prática desde antes da Inglaterra Vitoriana. Notem por exemplo quando encontramos pessoas ou outras famílias nas escolas dos nossos filhos. Quanto de verdade ou mentira existe nas conversas para as pessoas pintarem vidas melhoras do que elas realmente tem?

Mas enfim, não há porque se envergonhar desse comportamento. Como animais, fazemos ou seguimos nossos instintos buscando o melhor para a gente e nossa prole. Ao buscar formas de nos colocarmos em posições melhores na hierarquia social, aumentamos as chances de melhorar nossas vidas e de nossos filhos. Essa é a razão pela qual queremos ser reconhecidos. É por isso que projetamos vidas perfeitas nas redes sociais ou na roda de conversas.

Para finalizar, caso não consiga mimetizar uma vida que ganhe reconhecimento, não se puna por isso. Muito de nossos sofrimentos vem da dúvida de sermos ou não reconhecidos, aceitos, de termos valor na sociedade. Como diria Alfred Adler: “gostar ou não de você é tarefa do outro, não sua”.

É tudo tão mecânico…

Uma das primeiras idéias que me chamou a atenção nas aulas de Psicologia foi a do autômato. Esse é um conceito antigo que pode ser encontrado em eras antes de Cristo. Conceitualmente, um autômato “é um mecanismo que se opera de maneira automática, imitando movimentos humanos”. Autômato pode também ser entendido pela ” pessoa que age como máquina, apenas cumprindo ordens, sem questionar”. Para o propósito deste texto eu vou usar o segundo entendimento da palavra.

Faz alguns anos, na época em que eu viajava muito, me peguei com um aperto no peito quando passei a parar para admirar a beleza de paisagens, de pessoas, gosto de bebidas e comidas, etc. Ao admirar estas situações que eram passageiras naquele contexto, me pegava pensando: “nunca mais vou ver essa beleza, ou, dificilmente vou experimentar esse gosto novamente”. A efemeridade da experiência vivida me fazia sentir um mix de sensações, e devo dizer que na maioria das vezes tinha uma sensação forte de perda.

De certa forma, ao passar frequentemente por esse tipo de situação nas viagens eu acabei criando o hábito de contemplar, aproveitar a vista, o gosto, ou o que quer que seja no momento em que estou experimentando a internalização dos sentidos em meu corpo. Tive o estalo de escrever sobre isso porque no Domingo passado vivi isso novamente. Ao ir em um mercado para fazer compras vi uma pessoa muito bonita na fila do caixa. Logo me veio o pensamento: “nunca mais vou ver essa pessoa”. Então me permiti, por mais louco que pudesse parecer, olhar e ficar alguns segundos admirando aquilo que para meus olhos era muito bonito.

Mas porque eu estou falando isso? Voltando ao conceito do autômato, hoje em dia, convivendo com pessoas ao meu redor, vejo que não estamos contemplando as boas sensações que experimentamos. É tudo tão rápido, tão automático, que nosso comportamento lembra muito mais o de um robô do que de um ser humano. Vejo tantas pessoas preocupadas com a idéia de que máquinas vão roubar nossos trabalhos sendo que estas mesmas pessoas não conseguem perceber que os robôs são elas mesmas.

Acorda todo dia, vai trabalhar sempre seguindo o mesmo caminho, faz algumas refeições rápidas sem aproveitar o gosto da comida, volta para casa cansado, passa algumas horas rolando a tela do celular atirado em um sofá, come algo, toma banho, vai dormir… no dia seguinte, repete tudo de novo até chegar sexta feira. Isso para, no fim de semana, repetir as mesmas atividades do fim de semana anterior.

Qual foi a última vez que quebramos a nossa rotina? Fomos comer em um restaurante diferente sem o celular, fechamos os olhos para aproveitar o sabor de um vinho complexo e o gosto de uma comida simples. Qual foi a última vez que seguramos um copo de café com as duas mão, sentindo o calor do líquido e tomando com calma na companhia de alguém com uma conversa interessante? Qual foi a última vez que aproveitamos um longo beijo ou um caloroso abraço, esquecendo tudo que está do lado de fora? Qual foi a última vez que paramos por alguns minutos para admirar a beleza de uma pessoa ou de uma paisagem?

Por que fazer essas coisas no acima deveria significar quebrar a rotina? Não dá para sempre aproveitar as sensações? O que aconteceu com as nossas sensações, nossos sentimentos? A imagem do post mostra um coração mecânico sobre uma pessoa vagando por uma cidade grande. Será que é isso mesmo?

Você fala sozinho?

Eu falo, e com muita frequência 🙂 semana passada me peguei brigando comigo mesmo na academia porque notei que estava fazendo um exercício de tríceps da forma incorreta. Quando olhei para o lado, uma mulher me encarava provavelmente pensando: “esse cara é maluco, falando com ele mesmo sobre o exercício?”. Hahaha, a verdade é que eu não ligo. Especialmente depois que descobrir que muitas vezes o hábito de falar sozinho está associado a mentalização, algo que trás benefícios importantes em diversas áreas.

Antes de falar da mentalização, queria contar mais um caso engraçado. Li em um livro que durante o banho nós normalmente aplicamos muita reflexão sobre diversos assuntos. Sei de pessoas que fazem isso e têm ótimas idéias quando estão tomando banho (você que está lendo sabe que estou falando de você, hahaha). Eu, particularmente, fico fazendo alguns pequenos movimentos de esgrima, como se eu tivesse tentando aperfeiçoar esses movimentos. Um dia eu resolvi perguntar para o Pedro se ele também fazia isso no banho. Resposta: “hahahahaha, eu faço também”. Daí resolvi perguntar na academia se alguém mais fazia. Resposta: risos coletivos, pois muitos fazem.

Até uns três meses atrás eu achava que todos são muito loucos por fazer isso, eu inclusive. Mas depois de aprender sobre o exercício de mentalização, penso totalmente diferente. Existem diversos estudos que mostram os benefícios da mentalização nos esportes. Atletas de ponta realizam esse processo com resultados surpreendentes. Apliquei uma técnica com alguns jovens praticantes de esgrima e futevôlei e o resultado foi muito interessante. Aqueles que aplicaram a técnica com afinco e disciplina, conseguiram pódio em competições nas quais participaram.

É claro que não foi o exercício de mentalização que fez com que esses atletas tivessem sucesso. O sucesso deles vem de muita disciplina, treino e talento. Mas o exercício ajuda no processo psicológico em relação a participação em uma competição. Nos estudos a que me referi acima foi comprovado que atletas que praticam mentalização de forma frequente e consistente antes das competições tendem a “entrar” na competição antes que seus competidores que não fazem. Isso reduz o processo de estresse e melhora as ações do jogo.

Queria finalizar falando um pouco da aplicação da mentalização em outras áreas. Assim como em uma competição, pessoas que aplicam mentalização antes de apresentações ou reuniões importantes apresentam melhores resultados pelos mesmos motivos da aplicação no esporte. No contexto do trabalho ou escola, elas “entram” antes no evento em que irão se expor, praticam na cabeça os pontos chave de seu pitch e antecipam movimentos que outros participantes possam dar como perguntas e provocações.

No nosso dia a dia, o mundo em que passamos a maior parte do nosso dia é o da nossa imaginação. Podemos usar esse tempo em que passamos dentro de nossas cabeças para refletir sobre a vida, aprimorar e consolidar conhecimentos, antecipar e preparar respostas para eventos futuros, etc. Falar sozinho faz parte desse processo. Olhando sobre essa perspectiva, não parece tão louco assim se pegar conversando consigo mesmo, certo?

Vencedores e perdedores têm os mesmos objetivos

Li essa frase no livro Hábitos Atômicos do James Clear. É uma afirmação poderosa a interessante, mas faz todo o sentido. Paremos para analisar um pouco do ambiente em que estamos inseridos. Em qualquer ambiente vamos encontrar vencedores e perdedores. Em um ambiente competitivo do esporte vemos isso claramente. Todos dentro desse ambiente possuem os mesmos objetivos, ganhar, se destacar, mas apenas alguns conseguem. O mesmo acontece em nosso contexto social. Todos querem viver uma boa vida, confortável, com qualidade, mas alguns conseguem melhores condições que outros.

Se os objetivos são os mesmos, o que diferencia aqueles que conseguem mais daqueles que não conseguem chegar. O segredo está no esforço, na consistência, na disciplina, na construção. O segredo está no processo, na identidade vencedora de uma pessoa. O segredo está em olhar para dentro, em se focar no que está sob seu controle. O segredo está em NÃO perder tempo com fatores externos fora de nosso controle. O segredo está no processo, ou como o autor coloca, no sistema que decidimos seguir pelo tempo que seja necessário até chegarmos aos resultados.

Em outro livro, The Source, da Tara Swart, ela diz o seguinte: o resultado sempre chega, as vezes demora, mas chega. A persistência e confiança no processo de auto-construção vão fazer com que os objetivos sejam alcançados. Eu conheço muito bem a história de amigas que enveredaram pelo caminho do empreendedorismo. Levaram anos para consolidar sua primeira clínica, com muita persistência e um sistema rígido de construção. Estão iniciando seu segundo negócio e olhando perspectivas de mais crescimento.

Tenho um amigo nos EUA que é minha grande referência para conquistas esportivas. O cara é um touro no que diz respeito a disciplina e determinação. Um verdadeiro monstro que se construiu focado naquilo que ele pode controlar. Não bastasse tudo que ele construiu, segue buscando melhorar em outros aspectos psicológicos para seguir crescendo. É um super exemplo de como o processo entrega o resultado, cedo ou tarde.

Mas o maior exemplo de todos para mim é a minha esposa. Faz 10 anos ela teve um câncer grave com um prognóstico muito desfavorável. O tratamento era duríssimo, a taxa de desistência do protocolo de tratamento era enorme de acordo com os estudos científicos. Nunca vi tamanha força, persistência e determinação. Ela se agarrou naquilo que ela controlava, sua fé em Deus e nela mesmo para terminar o tratamento. Ela seguiu à risca, não importava o contexto. Resultado, 10 anos depois, firme e forte!

A grande maioria das pessoas não chega lá não porque não tem o potencial, todos temos. Não chegam porque desistem, não querem passar pelo trauma da mudança ou o suor da persistência. A diferença entre o vencedor e o perdedor é o quanto se persiste, com disciplina e inteligência. Os perdedores não entendem que o interessante é o caminho e não a chegada. É no caminho onde estão as experiências. O foco do vencedor é sua construção ao longo do caminho. Ele nunca vai dizer: “fui prejudicado”. A pessoa com identidade vencedora vai dizer: “levei um tombo, mas já vi onde tropecei, vou melhorar e vai ser bom”.