“Tenho minhas porcelanas”

Faz mais de 20 anos eu me mudei de Belém para São Paulo. Alguns anos depois, um dos meus irmão também foi para outra cidade. Nesse período, perdemos o nosso Pai, nossa Mãe ficou viúva. Hoje ela segue vivendo em Belém com nosso irmão mais novo. Quis dar esse preambulo para que possam entender o contexto da história que vem a seguir.

Hoje minha Mãe me mandou uma mensagem dizendo que estava com muita saudade da gente e que queria falar conosco. Liguei para ela e na nossa conversa tentei entender melhor o que ela estava sentindo. Lá pelas tantas eu perguntei: “Por que você não vem morar aqui em São Paulo? Largue tudo aí, pegue o Tico (nosso irmão mais novo) e venha! Você não tem nada que lhe prenda aí!”. Ela me disse que já havia pensado nisso mas que não era tão simples sair e deixar tudo. Ela me disse: “Tenho minhas porcelanas”.

Depois que escutei isso a minha cabeça travou… “como é que é?”, pensei! Conversamos um bocado sobre essa sensação dela de estar presa as suas porcelanas e outras coisas mais. Resolvi então perguntar qual havia sido a última vez que ela tinha usado essas tais porcelanas. “Na sua primeira comunhão”, me disse ela. Eu tenho 46 anos, isso significa que ela usou as tais porcelanas pela última vez faz mais ou menos 30 anos…

Bom, conversamos muito sobre isso. Vamos seguir conversando e tentar chegar a uma conclusão na vinda dela aqui em Abril para a competição Nacional do Pedro. Falei isso tudo para refletir com vocês um pouco sobre essa coisa que temos de nos prender ao material, de nos prendermos de tal forma que deixamos de viver e de fazer coisas que queremos pelas tais “porcelanas” que cada um de nós carregamos, mesmo que não usadas a muito tempo.

Essa história com minha mãe me lembrou de muitas outras. De pessoas que carregam coisas inacabadas. O material sempre aparece. Por exemplo, conheço outra família que tem uma casa fechada que está literalmente apodrecendo com tudo dentro. A casa fechada deixa de gerar riqueza para essa família, riqueza essa que poderia ser transformada em um bem maior para outras pessoas necessitadas. Assim como acontece com a porcelana da minha mãe, o que se encontra na casa dessa família também não tem uso. Está lá fechado a tanto tempo que ninguém dá mais falta.

Assim como acontece na casa dessa família, também ocorre dentro dos nossos armários, dentro de nossas casas, etc… somos acumuladores de coisas que nos seguram, que nos impedem de viver o nosso potencial, nossa felicidade total! Minha cabeça começou a mudar em relação a isso na época da pandemia, quando li o livro Essencialismo do Greg McKeown.

Mas, se o material que guardamos sem sentido aparece, não ocorre o mesmo com o espiritual, com o emocional. Guardamos com a gente sentimentos e emoções que carregamos todos os dias, coisas que nos fazem mal sempre que pensamos nelas. Dentro da gente, também temos “porcelanas” empoeiradas que ficam nos remoendo e impedindo que nos mudemos para o lado das pessoas quem queremos conviver, das sensações boas que queremos aproveitar.

Esse exercício de viver com o essencial, do material até os sentimentos, é algo que tento exercitar diariamente. Faz três anos, quando mudei de trabalho, prometi a mim mesmo que nunca mais me apegaria à empresa, ao produto ou trabalho. Isso deu certo porque me permitiu focar no que era essencial para o meu sucesso profissional. Nesse caso, se tratava de focar nos objetivos, fazendo o que precisava ser feito e liberando meu tempo para coisas mais importantes em minha vida: saúde (física e emocional), família e amigos.

Tenho várias histórias de “porcelanas” empoeiradas em prateleiras que deixei de lado, são ilustrativas para algo importante que é refletir sobre o que queremos e o que nos segura: Eu preciso mesmo disso? Isso está me atrapalhando de fazer o que realmente quero? Eu preciso carregar esse sentimento comigo? Por que não deixo essa “porcelana” de lado e vou lá abraçar quem eu gosto?

Uma parte importante da ansiedade que sentimos em nosso dia a dia está nas “porcelanas” desnecessárias que carregamos com a gente!

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Autor: André Ferreira

Diretor de Vendas LATAM na LivePerson, Doutor em Ciências, Mestre em Engenharia e MBA em Gestão de Operações pela POLI USP. Estudante de Psicologia.

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