Motivação versus obsessão

Tenho refletido ultimamente sobre a ideia de motivação e comecei a me questionar se é algo que faz sentido para a gente quando buscamos a nossa construção, nosso crescimento como pessoas. Coincidentemente, ao mesmo tempo que passei a me questionar sobre isso, iniciei a leitura do livro do David Goggins chamado Can’t Hurt Me. Eis que me deparo com aquela situação da tempestade perfeita para me fazer construir uma ideia nova ou derrubar uma ideia construída na mente por completo.

Uma característica da motivação que me incomoda um pouco é a sua transitoriedade. Nunca estamos sempre motivados para fazer algo transformador. Oscilamos entre momentos de extrema motivação para super baixa motivação. Quando buscamos transformações expressivas em nossas vidas, essa oscilação pode significar deixar de lado a transformação. Por exemplo, quantas pessoas você já viu prometendo iniciar o ano com uma atitude diferente quanto a sua saúde? Naquele dia a pessoa está super motivada para iniciar a mudança. Basta começar o ano e a motivação para a mudança já não existe mais. Isso se aplica em várias áreas, desde algo que queremos fazer para nós mesmos assim como uma mudança que queremos, por exemplo, implementar nos locais onde trabalhamos.

Bom, daí comecei a ler sobre obsessão. Quando pensamos em obsessão temos um certo preconceito, correto? Vemos normalmente a obsessão como algo doentio, que faz mal. Vamos tentar deixar esse preconceito de lado e começar a enxergar a obsessão como algo que nos dá a disciplina para a mudança. Quando ficamos obcecado por uma mudança positiva em nossas vidas, fazemos crescer dentro da gente a disciplina necessária para parar apenas depois que completamos, que finalizamos a mudança. Vamos voltar ao exemplo da nova atitude quanto a saúde no final do ano. Imagine que ao invés de motivado você está obcecado por um novo estilo de vida mais saudável. O ano vai começar e sua obsessão vai lhe dar a disciplina para iniciar a mudança de estilo de vida. Não somente isso, vai lhe dar a disciplina para manter a mudança até que ela se consolide meses ou anos após seu início.

O David Goggins fala muito sobre isso no seu livro, sobre como a obsessão e a disciplina que vem com ela nos ajudam a realizar mudanças estruturais em diversas áreas de nossas vidas. O lance então se torna entender como nossa mente pode se tornar obcecada por uma ideia. Esse processo vem normalmente de uma experiência que gera um impacto significativo, algo como um trauma psicológico. O Goggins teve uma vida zoada. Meu filho sofreu com derrotas na esgrima e situações chatas na escola. Enfim, cada um de nós temos nossos desafios, nossos momentos difíceis. A vida é cheia de situações traumáticas para cada um de nós. A questão passa a ser se aproveitar destas situações para criar a obsessão para mudar para melhor.

A obsessão pode ser boa se olharmos ela como algo que pode nos ajudar a nos tornarmos melhor através da disciplina. As situações gatilho para mudança vão ocorrer, seja em nossas vidas pessoas, profissionais, etc. Podemos usar estes traumas, ou como o Alfred Adler chama: força criativa, não para nos motivarmos, mas para nos tornarmos obcecados. Obcecados por sermos pessoas melhores!

Quando realmente envelhecemos…

Quando chegamos na marca dos 40 anos começamos a perceber mudanças em nosso corpo e a valorizar certas partes dele. Normalmente a nossa visão de perto começa a ficar prejudicada e ver a tela de um celular passa a se tornar um desafio. Nossas costas começam a doer com mais frequência e outras partes ficam com movimentos mais limitados. Nosso sono fica mais leve e já não conseguimos dormir muito tempo. Enfim, ao nos depararmos com essas situações costumamos dizer: estou envelhecendo.

Quando comecei a estudar Psicologia e iniciei uma faculdade com 45 anos, passei a tentar entender um pouco melhor esse processo de envelhecimento. Neste momento, me parece que envelhecer não é algo relacionado exclusivamente ao nosso corpo, ao contrário, está mais relacionado a nossa mente, a forma com que nos comportamos ou buscamos nos comportar frente ao ambiente que nos cerca. Eu penso desta forma por conta da maneira como vivo. Hoje, aos 45 anos, me sinto mais novo do que quando tinha 30.

Tem dois fatores que acho que são críticos no processo de envelhecimento. Talvez, se buscarmos cuidar destes dois pontos possamos ficar mais novos. Vou falar um pouco de cada um deles e como eles influenciam em uma característica que o nosso cérebro possui e que a Neurocientista Frances Jensen chama de plasticidade cerebral.

O primeiro deles é batido e muito discutido no meio científico. Hoje inclusive faz parte do senso comum a ideia de que temos que nos exercitar. O que quero destacar aqui não é simplesmente o exercício, mas a nossa capacidade de fazer cada vez mais, mesmo quando a idade avança. Eu comecei a fazer exercícios depois dos 45. Não conseguia correr 2 quilômetros, não conseguia fazer 3 flexões de braço, etc. De forma progressiva, lenta, mas consciente, fui puxando cada vez mais do meu corpo. Sempre com o apoio de profissionais da área, hoje meu corpo me entrega mais do que quando tinha 30 anos. Encontrei na atividade física com progressão do esforço e o aprendizado de novos exercícios a minha fonte da juventude física.

O segundo é diferente do que estamos acostumados a fazer ao irmos avançando na idade. Normalmente, tendemos a nos cercar pelas mesmas pessoas à medida que chegamos aos 45 anos. Falamos dos mesmos assuntos e não nos abrimos a novas ideias ou visões de mundo. No meu caso, percebi isso depois que entrei na faculdade de Psicologia. Mesmo em um esquema remoto, conheci pessoas novas, com visões de mundo totalmente diferentes da minha e, muito mais novas em idade. As ideias destas pessoas associadas a energia delas nos torna diferente, nos dá um gás e nos rejuvenesce por dentro, na mente. O jornalista Joe Keohane fala como conhecer pessoas novas tem a capacidade de nos mudar no livro The Power of Strangers.

Estas duas coisas, o exercício com progressão de esforço e estar inserido em um contexto que nos permita conhecer pessoas com visões de mundo diferentes nos dão a possibilidade de aprendizado continuado, de estar sempre em movimento físico e mental. Nos ajudam a encontrar sensações agradáveis todos os dias impulsionadas por diversos processos fisiológicos através da produção de hormônios que aumentam o prazer e diminuem o estresse. Esse aprendizado diário é possibilitado pela plasticidade cerebral que a Dra. Frances Jensen desta em seu livro The Teenage Brain. Lá ela fala de pesquisas que mostram, por exemplo, que pessoas acima dos 70 anos que aprendem e dançam Tango possuem mais atividade cerebral e diminuem risco de doenças degenerativas.

Resolvi escrever sobre isso aqui porque acho que pílula vermelha neste caso está não somente na ideia de que precisamos evoluir o nosso físico, mas, principalmente, que temos que nos abrir para conhecer pessoas novas, mais jovens. Ter contato com novas visões de mundo é sensacional. Quando deixamos nosso corpo e mente se deteriorarem, ou até mesmo estagnarem, é quando realmente envelhecemos.

Nossos vários eus

Não havia parado para pensar na possibilidade de ter várias personalidades. Escutamos falar sobre isso com frequência em filmes, mas é muito provável que você também não tenha tido a chance de pensar que também tem várias personalidades. Você, seu filho, irmão, mãe, esposa, etc…

Semestre passado tive aulas sobre Teoria da Personalidade. Antes disso eu nem sabia ao certo o que é ter uma personalidade. Comecei a entender e colocar junto conceitos aprendidos em análise do comportamento e Filosofia e a ideia de que temos várias personalidades começou a aparecer na cabeça.

Foi assistindo a série Ruptura na Apple TV+ que a ideia se consolidou. Então comecei a entender, por exemplo, porque crianças se comportam diferente na frente dos pais. Ontem, inclusive, cheguei a conclusão de que a maioria dos pais não conhecem seus filhos, eu me incluo nessa lista. Talvez não conheçamos bem ao certo as pessoas com quem convivemos por décadas.

O fato de que temos múltiplas personalidades explica bem esse desconhecimento acerca de quem convivemos. Nosso comportamento muda de acordo com o contexto que vivemos. Por exemplo, no trabalho, passamos a fazer coisas que não fazemos na nossa vida pessoal, e vice versa. Conseguem notar como isso tem implicações em nossas vidas?

Em todos os contextos nos adaptamos para tentar nos encaixar aquilo que a “norma”, no sentido de normalidade, nos impõe. Crianças se comportam na frente dos pais e se soltam quando estão longe, porque o contexto pede isso. São tolas na frente dos pais porque os pais reforçam (na linguagem da behaviorismo) esses comportamentos. Somos agressivos no esporte e as vezes no trabalho para não sermos comidos por leões. Assim a lista vai…

Para finalizar, estamos prestes a entrar em um mundo que vai criar uma infinidade de personalidades em nossas cabeças… com a lógica do Metaverso, vamos poder ser quem quisermos. Daí o desafio vai ser separar essas múltiplas personalidade em cada parte da vida. Vai ser interessante ver isso… Terreno fértil para os psicólogos pela frente 🤪

O fardo da Liberdade

A primeira vez que li sobre isso dei um travada… como assim a liberdade ser algo pesado? Fui ler mais a respeito e pude entender um pouco da origem deste problema. Basicamente, com a revolução industrial e a possibilidade de especialização do trabalho, começamos a migrar para as grandes cidades. Nesse processo de migração, deixamos nossas famílias e começamos a viver mais sozinhos, passamos a dispor de mais opções e, consequentemente, mais liberdade. 

Mais do que nunca a lógica do capitalismo liberal (e não me entenda mal, sou capitalista, inclusive me encontro na terra do Tio Sam no momento em que escrevo esse artigo) vem nos possibilitando cada vez mais opções. Hoje em dia temos opções para uma série de coisas que realizamos ou queremos. De certa forma, é a abundância de opções que nos gera a sensação de liberdade. Tenho a liberdade de “fazer” o que quero, de “escolher” o que quero. Desde bem cedo as crianças podem escolher seus conteúdos, seguir seus YouTubers ou TikTokers favoritos. Quando adolescente temos uma infinidade de opções de estudo e educação, depois opções de lazer, e por aí vai…

Mas até onde tantas opções e liberdade de escolhas é bom para a gente? A liberdade passa a ser algo pesado para nós quando a quantidade de opções é tamanha que começamos a ficar ansiosos ou angustiados por ter que fazer uma escolha. Queremos ter a conveniência da liberdade de escolha mas, ao mesmo tempo, paradoxalmente, o conforto ou a “preguiça” de não ter o trabalho da escolha.

Ao estudar essa questão vi o quanto ela está ligada ao nosso dia a dia. Nos deparamos com situações complexas e que tratam de vida ou morte quando médicos nos dão opções do que fazer quando necessitamos de algum tratamento. Louco, né? Como assim um médico me dar uma lista de opções e me perguntar o que quero fazer? Ele não deveria escolher o que é melhor pra mim? Bom, não é à toa que governos tomam decisões por nós todos os dias e que empresas nos empurram a fazer certas escolhas (isso é chamado de Nudge).

A liberdade de escolha vem com o fardo da decisão consciente. Tomar uma decisão consciente é trabalhoso e impõe um custo psicológico alto em várias pessoas. Isso ocorre em diversas áreas de nossas vidas. Para terminar, esse contexto vem sendo muito estudado no mundo corporativo sob a nomenclatura de arquitetura de decisões. Isso para reduzir a carga cognitiva e psicológica de decisões.

Se liguem, oferecer muita liberdade não é a melhor alternativa. Não é pelo simples fato de que não gostarmos das sensações trazidas com fardo imposto pela liberdade.