O medo…

O que é o medo? Gosto de definir medo como: uma reação que gera sensações desagradáveis em nossos corpos. Por exemplo, medo de ser assaltado na rua gera em nosso corpo sensação de sudorese, taquicardia, respiração acelerada, etc. Outro exemplo, medo de participar de uma competição esportiva, frio na barriga, náusea, tontura, dor de cabeça, calor no corpo, etc. Medo de voar de avião, insônia, falta de apetite, tremor nas mãos, etc.

O lance do medo que normalmente não prestamos atenção é que, na grande maioria das vezes, o medo é aprendido por nós, é condicionado na gente. Isso acontece por conta das experiências passadas que tivemos, vimos ou nos foi dita, que faz com que encaremos determinadas situações com medo. Por exemplo, comecei a ter medo de voar de avião depois que passei por uma turbulência muito forte numa viagem quando tinha 10 anos.

Bem, agora que sabemos que o medo tem uma origem, se quisermos de alguma forma tentar corrigir ou encarar os medos que sentimos, precisamos entender suas condicionantes, precisamos descobrir quais o início dos nossos medos. Aqui precisamos fazer outra distinção. Existem as origens tangíveis do medo, ou seja, aquelas que realmente ocorreram como parte da nossa experiência de vida e as origens que criamos em nossa mente, algo como uma disfunção cognitiva que gera situações que, de verdade, não sabemos se são reais ou não.

Para finalizar, quero falar um pouco deste segundo grupo, dos medos que criamos. Meu filho tem medo de competir, ele sente um calor incontrolável antes das competições. Nunca entendemos essa reação até que um dia em uma conversa ele nos disse: eu vejo na esgrima uma forma de dar orgulho para vocês, eu compito por vocês, quero ir para a seleção Brasileira por vocês. Nunca pedimos isso para ele, achávamos que ele jogava por prazer. Ele criou essa ideia que impõe nele um medo de nos desapontar. Quantos medos, como no exemplo do Pedro, criamos em nossas mentes?

É provável que o medo que criamos em nossas mentes seja o mais comum de todos. Ele é muito sutil, difícil de ser descoberto. Ao mesmo tempo um forte gerador de ansiedade e sensações ruins em nossos corpos.

Nada é para sempre…

Descobri que nada é para sempre de uma forma dolorosa. Quando temos um filho, ficamos com a ideia de que ele vai ficar junto conosco o resto da nossa vida. Vivi na pele a verdade de que nada é para sempre. A partir daquele momento o mundo começou a mudar para mim. Tudo aquilo que eu acreditava que era fixo e imutável se tornou fluido, frágil.

Neste processo de mudança, comecei a perceber que me prendia a ideias que nos são ensinadas desde cedo e que não são necessariamente certas, ou não mais. Nasci em Belém do Pará, em uma família tradicional religiosa devota de Nossa Senhora de Nazaré. Estudei quase que a vida toda em uma escola Católica. Esse contexto em que fui criado, vocês podem imaginar, formou em mim uma série de valores, crenças e ideias. Cada pessoa cresce seguindo uma lógica parecida, recendo influência e sendo construída com base no que sua família, sua escola, as pessoas ao seu redor lhe ensinam.

Mais recentemente tive a oportunidade de entender como alguns filósofos como Michel Foucault pensavam sobre a moral: “conjunto de valores e regras de ação propostas aos indivíduos e aos grupos por intermédio de aparelhos prescritivos diversos, como podem ser a família, as instituições educativas, as Igrejas, etc.”. O pulo do gato em relação a esse pensamento é entender que, à medida que estes “aparelhos prescritivos” mudam, nossos valores e regras de ação também mudam. Logo, aquela ideia de que acreditávamos ser verdade num momento da vida, pode não ser em outro momento.

Onde eu quero chegar com isso? Sim, no título deste texto: nada é para sempre. Participo de alguns ciclos de amizade onde conversamos bastante sobre o hábito das pessoas na sociedade. É normal vermos amigos criticando novos hábitos e preferências de pessoas que nos cercam, de pessoas que frequentam os mesmos locais que frequentamos. O que normalmente não entendemos é que, como disse Foucault, os novos hábitos são formados por novos “aparelhos prescritivos”. Não podemos criticar novos valores, hábitos ou preferências. Precisamos respeitar e entender. Nós mesmos como famílias somos um dos pilares que ajudaram a construir os novos valores.

Não nos prendemos somente a questões culturais, hábitos, etc. Muitas vezes nos prendemos a ideias que nós mesmos criamos para a gente. Uma vez trabalhei em uma empresa onde fui ameaçado de demissão por baixa performance em vendas. Minha primeira reação com a ameaça gerou uma sensação ruim porque estava preso à ideia de que seria muito difícil iniciar algo novo fora daquele local. Depois de refletir muito, revendo tudo pelo qual já havia passado, conversar com amigos e minha família, cheguei à conclusão de que o melhor era sair. Como resultado, voltei para a empresa e pedi para que eles não ameaçassem e sim executassem a minha demissão. Foi libertador!

A leitura, o estudo, a convivência com novos ciclos de amizade me ensinaram muito. A minha experiência de vida e todos os perrengues pelo qual passei e passo sempre me ensinam. Hoje me prendo a pouquíssimas ideias fixas, e sei, que mesmo estas poucas ideias fixas podem cair aos poucos. Vivo melhor aceitando a fluidez das construções sobre as quais nossas ideias são criadas. Isso me ensinou a entender e respeitar a construção de cada pessoa com a qual eu convivo.

Não é ruim saber que nada é para sempre. Na verdade, é bom porque estamos sempre aprendendo, evoluindo e experimentando boas sensações. Essa talvez seja uma das pílulas vermelhas mais interessantes para se tomar.

A vitória não ensina muito…

O que as nossas vitórias na vida nos ensinaram? Se pararmos um pouco para refletir sobre isso provavelmente vamos chegar à conclusão de que as nossas vitórias nos ensinaram muito pouco, se é que ensinaram alguma coisa.

Voltamos às famosas abstrações criadas por nós para dar significado as nossas vidas. A vitoria é mais uma dessas abstrações. Nós somos criados e educados para ter vitórias na vida. Muito gira ao redor disso, pois precisamos “vencer na vida”. Esse é um dos nossos lemas principais, certo?

O problema são as implicações disso, pois corremos o risco de achar que vencer a qualquer custo seja o meio justo para alcançar o objetivo final. Nos tornamos discípulos de Maquiavel: os fins justificam os meios.

Li um artigo super interessante chamado “O imaginário da derrota no esporte contemporâneo” da Katia Rúbio da USP. La ela revisa a história de atletas olímpicos e como funciona o pensamento deles sobre ganhar medalhas que não as de ouro. Se não for ouro, não interessa para muitos. Esse tipo de pensamento está associado a um dos fatores que levam ao doping, por exemplo.

Nesse fim de semana no torneio Infantil e Pré Cadete de Esgrima em Porto Alegre vi alguns comportamentos de crianças que vão, de certa forma, nessa direção. Não que as crianças não possam ficar aborrecidas com suas derrotas, mas deixar de cumprimentar adversários, usar de artimanhas para atrasar o jogo, são exemplos de atitudes que passam a impressão de que elas precisam ganhar a qualquer custo.

Por outro lado, vi crianças fazendo totalmente diferente, crianças que perderam de cabeça erguida, foram lá resignadas e deram um abraço fraterno no vencedor, no técnico e provavelmente reconheceram que, na quela oportunidade, seu oponente foi melhor.

Mas por que vencer a qualquer custo? Será que aprendemos algo com essas vitórias? Provavelmente vencer a qualquer custo está ligado a nossa construção, como falei anteriormente, ou a expectativas que criamos em nossas crianças, que nós mesmos criamos na gente e muitas outras explicações. Mas o mais grave é que a vitória não ensina nada, não nos faz melhores, não nos muda.

A derrota, por outro lado, sim nos faz melhores. Através da frustração da derrota, pelo sentimento de inferioridade na situação, encontramos o que o Psicólogo Alfred Adler chama de Força Criativa. Essa força criativa é que nos dá o que precisamos para o salto evolutivo. É na derrota, com as frustrações da vida, que encontramos forças para nos tornamos melhores.

No final do primeiro torneio de Sabre do Pedro eu sentei do lado dele e perguntei: você sabe o que significa frustração? Sei, papai, ele disse. Então falei: você está frustrado com o resultado? Ele diss: sim, estou. Então falei: pois fique, entenda o porque da sua frustração e tente melhorar se não quiser se sentir assim de novo.

Hoje a Psicologia como ciência mostra que uma forma poderosa de mudança de comportamento ocorre com a auto-observação. Não adianta dizer: você perdeu por causa disso e daquilo. Funciona mais quando a seguinte reflexão ocorre: você consegue me dizer por que acha que perdeu? O aprendizado é melhor e a resposta mais eficiente.

Ganhar é OK. As vitórias precisam ser celebradas. Mas perder é igualmente importante. Perder com a consciência da derrota, reconhecendo e encontrando as forças para melhorar. Não há tabu na derrota, vamos perder na vida e não há nada que possamos fazer se não aprender e melhorar com isso. Por que não falar abertamente disso? Aprendemos de verdade com as derrotas. Depois, com tempo, maturidade e consciência, as vitórias são naturais… não só no esporte, na vida toda!

Este fim de semana o Pedro me mostrou que Alfred Adler estava certo!

Resultados imediatos

Não estava pensando em falar sobre isso hoje, na real, aconteceram algumas coisas no final de semana que me fizeram mudar a agenda de texto e priorizar esse assunto. No livro Creativity Inc. os autores Ed Catmull e Amy Wallace falam sobre uma frase dita por George Lucas que também é citada em um dos filmes do Star Wars: The journey is often more importante than the destination. Em tradução livre seria algo como: A viagem é normalmente mais importante que o destino. Conversando sobre as situações do fim de semana, o Rodrigo Baldin me lembrou também da música do Aerosmith, Amazing: Life’s a journey, not a destination (A vida é uma jornada, não um destino).

Se pararmos para observar bem as nossas vidas vamos achar uma série de indícios de que estamos muito mais preocupados com o destino do que com a jornada. A nossa educação e os estímulos que recebemos em nosso dia a dia se focam exclusivamente na parada final. Deixamos de nos concentrar no presente e em curtir o que estamos fazendo no momento. Lembram do filme Sociedade dos Poetas Mortos: Carpe diem. Seize the day, boys. Make your lives extraordinary (Seize the day — Aproveitem o dia). O que está rolando com as nossas vidas?

Bom, como falei, somos educados e condicionados a olhar mais para o futuro do que para o presente. Desde cedo, se olharmos para a educação religiosa Cristã tradicional, por exemplo, vemos uma ênfase ao que vai acontecer com a gente quando morrer. Se analisarmos o sistema educacional em si, notamos o foco nas notas de cada ciclo como praticamente única forma de avaliação do aprendizado do aluno. Ao entrar no ambiente de trabalho nos deparamos com as métricas malucas impostas pelo resultado trimestral a qualquer custo e de curto prazo. Sempre o foco no destino, quase nunca no caminho, na jornada.

Faz algum tempo que os Psicólogos procuram trabalhar e mudar o nosso foco para o presente. O Psicólogo Alemão Frederick Perls, por exemplo, põe ênfase no agora e define ansiedade como a lacuna, a tensão entre o “agora” e o “depois”. Para ele, as pessoas que não conseguem viver o agora possuem uma certa neurose. O Psicólogo Americano B.F. Skinner aborda uma outra perspectiva colocando a questão do reforçamento positivo através de estímulos prazeirosos e de curto prazo. No texto O que está de errado com a vida cotidiana no mundo ocidental? Ele mostra como as coisas ficaram mais “fáceis” para nós nos últimos anos gerando estes estímulos de curto prazo. Um exemplo interessante é o do controle remoto. Vocês já repararam que muitas vezes ficamos mais tempo no controle mudando de canal do que assistindo um conteúdo? A simples mudança do canal gera estímulos imediatos. Um mecanismo semelhante a preferência das séries com episódios mais curtos à filmes no dia a dia. Ou a troca, nos estudos, de cursos de graduação de 4 ou 5 anos por cursos super curtos que “formam” uma habilidade específica.

O resultado disso, como Perls colocou, é a galera toda com crises de ansiedade. Mas no livro Flow o Psicólogo Húngaro Mihaly Csikszentmihalyi (já falei sobre ele antes) mostrou alguns caminhos para inverter essa lógica, ou seja, fazer com que trabalhemos e aproveitemos mais a jornada. Com a jornada sendo bem aproveitada e bem feita, o resultado final vem. Ele cita diversos exemplos de pessoas que entram em Flow (esse é o termo que ele usa) como Tenistas, Médicos Cirurgiões, etc. Para mim, a pílula vermelha sobre o imediatismo de resultados veio quando engrenei na musculação. Muita gente me pergunta: você faz 90 minutos de musculação todo dia, como aguenta, é chato, o resultado demora para acontecer? Poisé, parece que entrei em Flow na musculação. Curto cada aparelho, cada movimento, cada conversa com o pessoal da academia. Estar lá me coloca em um estado de constante aproveitamento. O mesmo acontece quando corro e mais recentemente quando treino funcional ou Esgrima.

Isso que aprendi nos exercícios se abriu em outras partes da minha vida. No meu trabalho, quando curto cada atividade que estou fazendo, cada conversa com pares, clientes e parceiros. Nos estudos, em cada aula, livro ou conversas com a turma. Com minhas relações interpessoais, quando procuro olhar no olho das pessoas e prestar atenção a cada palavra que elas dizem, principalmente minha mulher e filho. O que vai acontecer no futuro como consequência de tudo isso me interessa muito menos do que o que estou aproveitando a cada momento fazendo estas coisas todas. Carpe diem.