Não queremos ouvir a verdade!

Você está em um relacionamento estável faz muito tempo. Vive a vida perfeita, tem sua casa confortável, dois carros importados na garagem e viaja frequentemente. Conseguiu tudo isso com o seu companheiro, os dois somaram e construíram essa vida juntos. Você não sabe, mas seu companheiro possui outro relacionamento faz algum tempo. Você gostaria de saber que ele tem esse relacionamento fora colocando tudo que construíram em risco, ou prefere ficar na ignorância?

Você tem um cargo de executivo em uma empresa grande. Seu dia a dia é super atribulado, você está sempre apagando incêndios, com pouco tempo para pensar em como evoluir seu negócio. Na interação com alguns pares, começa a perceber que tem muito mais coisa de errado na sua área. Você passa a observar o comportamento das pessoas e começa a ter certeza de que a quantidade de problema é cinco vezes maior do que você já tem que gerenciar. Você vai a fundo para escavar e tentar resolver os novos problemas ou fica esperando a merda bater no ventilador para fazer alguma coisa?

Duas situações reais, que diversas pessoas encontram com frequência. Situações com contextos parecidos são parte das nossas vidas e é normal que de frente à estas situações, não façamos nada, não encaremos a verdade. Isso é da natureza humana, ocorre com a maioria das pessoas (provavelmente já aconteceu com você que está lendo esse texto) por uma série de razões.

O Psicólogo Americano Carl Rogers dizia que quando experimentamos algo que está “desalinhado” com o que ele chamou de autoconceito (algo semelhante ao que conhecemos como visão de mundo), nós distorcemos ou negamos à realidade como mecanismo de defesa. Para ele, as pessoas que não conseguem lidar com estas situações enfrentam obstáculos à saúde psicológica através de sentimentos de ansiedade e ameaça.

Talvez uma das primeiras descrições de negação da verdade tenhamos visto no Mito da Caverna de Platão. Para quem não conhece, basicamente o negócio se desenrola da seguinte forma: Imagine que você tenha sido criado preso dentro de uma caverna. Tudo o que você consegue ver é a projeção da luz da entrada da caverna em uma parede na sua frente. Você vê apenas sombras de animais, de árvores, etc. Outras pessoas foram criadas da mesma forma com você. Um dia você se solta e sai da caverna. Quando vê o mundo como ele é se encanta e volta para dizer para o pessoal da caverna: “Pessoal, vou soltar vocês para verem o mundo maravilhoso lá fora”. As pessoas que escutam dizem: “Mundo lá fora? o que conhecemos é isso aqui, não queremos sair, não queremos ver nada diferente do que já vemos”.

Uma outra negação está na forma como podemos interpretar a passagem da Maça do pecado no antigo testamento. A interpretação tradicional, que aprendemos na educação Cristã diz que a Eva pecou ao aceitar a maçã da Serpente. No livro O Mal, Como Explicá-lo? a autora Maria Soares apresenta uma visão diferente, onde a serpente é Deus que oferece a maçã como fonte de conhecimento à Eva. Parece que a Eva tomou a pílula vermelha e todos passamos a negar isso desde sempre…

Enfim, estes comportamentos de distorção ou negação surgem, como disse Rogers, por conta dos sentimentos que manifestamos quando não conseguimos lidar com as verdades, sentimentos de ansiedade e ameaça originados por reações fisiológicas que ocorrem em nossos corpos. Frio na barriga, ânsia de vômito, suor excessivo, coração acelerado, etc. Ao negarmos e distorcermos as verdades, queremos no fundo evitar estas reações desconfortáveis.

Muitas, muitas vezes não temos controle sobre o mundo. As coisas são como são. Vamos tomar a pílula vermelha com a coragem da Eva, ou vamos seguir evitando e distorcendo tudo que aparece de difícil na nossa frente? Eu, particularmente, gosto da visão do psicólogo Húngaro Mihaly Csikszentmihalyi. No livro Flow, ele mostra que existem formas positivas e agradáveis (que desperte sensações boas em nossos corpos) de encarar as mais duras situações.

Avatar de Desconhecido

Autor: André Ferreira

Diretor de Vendas LATAM na LivePerson, Doutor em Ciências, Mestre em Engenharia e MBA em Gestão de Operações pela POLI USP. Estudante de Psicologia.

Deixe um comentário